Tuesday, February 27, 2007

Comadre Fulozinha...


Escrever sobre uma banda sempre é uma tarefa complicada. Digo isso porque é difícil para uma banda, ou um cantor, ou um gênero musical, agradar a gregos e troianos e, claro, quando escrevemos sobre uma banda que a gente gosta, a tendência é sempre ficar nos elogios.

Mas no caso do Comadre Fulozinha, todo e qualquer elogio é justificado (e verdadeiro).

Uma das coias mais originais dessa banda pernambucana é que é formada por mulheres. Bom, justiça seja feita, o saxofonista da banda é varão. As meninas são todas lindas, as composições belíssimas, a sonoridade incrível. É uma banda que veio para preencher uma lacuna no cenário musical brasileiro: a de uma banda feminina que toca música brasileira de qualidade, coisa rara hoje em dia, que nem goiabada cascão em caixa: é coisa fina sinhá, que ninguem mais acha (como na música da Beth Carvalho).

Mas deixa eu fazer um pequeno introdutório da banda. No vocal temos a artista multimídia Karina Buhr (a moça além de música, é compositora, atriz de teatro e desenhista!), que também toca percussão e rabeca. Letícia Coura toca cavaquinho, violão, participa dos vocais e também faz percussão. Flávia Maia e Dani Zulu participam na voz e percussão. Mairah Rocha faz voz, gaita e percussão e, finalmente, bendito fruto entre as mulheres, temos o sortudo do Marcelo Monteiro, que toca sax e flauta. Tem ainda a Isaar de França, mas ao que parece essa moça participa da banda esporádicamente...

O nome da banda, também deveras original, vem de um personagem do folclore da Zona da Mata de Pernambuco, a comadre fulozinha. Pelo que andei pesquisando é uma espécie de curupira. É uma caboclinha de grande cabeleira derramada nas costas, servindo-lhe de chicote. Ela tem os olhos escuros, é zombeteira, malvada. Tem o poder de se transformar ora em mocinha, ora em animais, ora em um menino magro. Ela desaparece sem deixar rastro. Uma das suas distrações é fazer tranças nas caudas dos cavalos, surrando os cachorros que encontra na mata e desorientando os caçadores com seus assobios. Ela protege a caça contra os caçadores. Orgulha-se de sua ascendência selvagem. Como a curupira, detesta pimenta no seu mingau. A Comadre Fulozinha gosta muito é de fumo (Fonte: Dicionário de Folclore para Estudantes).

Começo transcrevendo aqui a biografia da banda escrita pelas próprias meninas, que você pode conferir no espaço delas no MySpace (Comadre Fulozinha):

A Comadre Fulozinha tem como base a percussão e as vozes, numa mistura de ritmos com influências variadas, usando pandeiros, congas, zabumba, bombo, ilú, cavaquinho, rabeca, violão e saxofone. Criada em 1997, tem dois CDs gravados o "Comadre Florzinha" (CPC Umes) e "Tocar na Banda" (Ybrazil). Entre 2000 e 2001 fez sua primeira turnê internacional, com apresentações em festivais no Canadá, Estados Unidos, Bélgica, Suíça e França, participou do festival Strictly Mundial e Mercado Cultural em Salvador. Em 2003 tocou na noite de encerramento do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, na Fête de la Musique, em Paris e gravou o programa “Ensaio” da TV Cultura. Em 2005 tocou no teatro Volksbühne, em Berlim, integrando o show “Música Mestiça”, dentro do projeto de apresentações da peça “Os Sertões”, do Teatro Oficina. Tem participações em CDs como “Por Pouco”, da banda Mundo Livre S/A; “Contraditório?” e “Dj Dolores e Aparelhagem”, de Dj Dolores; “Original Olinda Style”, da banda Eddie; “BSC” da Bonsucesso Samba Clube; “Pernambuco Falando Para o Mundo”, de Antônio Nóbrega, “Jornal da Palmeira”, de Erasto Vasconcelos, entre outros. Participou também das coletâneas “Baião de Viramundo”, “Pernambuco em Concerto IV”, “Reiginaldo Rossi”, “Music from Pernambuco” e “Música de Pernambuco”. Participou da criação coletiva da trilha sonora de “Os Sertões - A Terra” (como integrantes do “Côro 2002”), vencedora do Prêmio Shell de Teatro SP-2002 na categoria Melhor Trilha Sonora. Participa das trilhas sonoras da peça e do filme “A Máquina”, de João Falcão, dos filmes “Deus é Brasileiro”, de Cacá Diegues, “Fábio Fabuloso”, de Ricardo Bocão, “Enjaulado”, de Kléber Mendonça Filho e “Narradores de Javé”, de Eliane Caffé.

Aliás, visitem o esoaço delas no MySpace. Vale a pena. Além de dados biográficos da banda, tem uma porção de fotos, músicas para baixar em MP3, letras...

Aqui abaixo eu divido com você, leitor, o PRIVILÉGIO de assistir uma apresentação das moças gravada no circo voador, Rio de Janeiro, em 2004, que eu carreguei no YouTube:



Mas para sentir os benefícios da Comadre, não basta ler, tem que ouvir. A voz de criança da Karina, a percursão IRADA que deixaria muito negão tocador de tambor aqui na África do Sul com inveja (no bom sentido, claro) e a melodia mágica do sopro do Marcelo Monteiro...

Parabéns, comadres. Vocês são uma das melhores bandas jovens que apareceram nos últimos anos no Brasil e a prova viva que a cultura brasileira, ainda que maltratada pela mídia de massa, está viva - e bem.

Sucesso!

Cidade do Cabo, África do Sul, 01 de Março de 2007.

PS: Aguardo ansioso o terceiro CD... ;-)

Plei

Sunday, February 25, 2007

Só complementando o último post...

...aqui vai a letra de uma música do Lenine, que ilustra a questão do ódio ao volante.

Rua da Passagem (trânsito)

Composição: Arnaldo Antunes / Lenine

Os curiosos atrapalham o trânsito
Gentileza é fundamental

Não adianta esquentar a cabeça
Não precisa avançar no sinal

Dando seta pra mudar de pista
Ou pra entrar na transversal

Pisca alerta pra encostar na guia
Pára brisa para o temporal

Já buzinou, espere, não insista,
Desencoste o seu do meu metal

Devagar pra contemplar a vista
Menos peso do pé no pedal

Não se deve atropelar um cachorro
Nem qualquer outro animal

Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual

Motoqueiro caminhão pedestre
Carro importado carro nacional

Mas tem que dirigir direito
Para não congestionar o local

Tanto faz você chegar primeiro
O primeiro foi seu ancestral

É melhor você chegar inteiro
Com seu venoso e seu arterial

A cidade é tanto do mendigo
Quanto do policial

Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual

Travesti trabalhador turista
Solitário família casal

Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual

Sem ter medo de andar na rua
Porque a rua é o seu quintal

Todo mundo tem direito à vida
Todo mundo tem direito igual

Boa noite, tudo bem, bom dia,
Gentileza é fundamental

Pisca alerta pra encostar na guia
Com licença, obrigado, até logo, tiau.

O Lenine é foda.

Ódio Humano





Oi pessoal.

Depois de muito tempo sem postar nada, estou de volta.

E hoje para falar de uma coisa que me entristece muito, que é o ódio humano.

Na semana que antecedeu o carnaval, o Brasil se chocou com mais um dos inúmeros absurdos da violência urbana nas grandes cidades. Sim, me refiro ao triste episódio do menininho arrastado até a morte pelas ruas do Rio de Janeiro. Ganhou espaço na mídia, tocou os corações de milhares de brasileiros. Isso me trouxe a mente uma cascata de absurdos que aconteceram (e acontecem) no Brasil, como os ataques do PCC, bandidos queimando carros com famílias dentro, bebês colocados em sacos plásticos e jogados em lagoas e uma infinidade de outras coisas que me dão ânsia de vômito só de lembrar.

Mas o problema todo é que esse não é um episódio isolado. A barbárie se repete a todo momento, não só no nosso país, como também no resto do planeta. Por exemplo, hoje mesmo no site do terra eu tive o desgosto de ler uma notícia sobre prostituição, assassinato e desova de corpos de meninas sequestradas na Letônia (http://noticias.terra.com.br/mundo/interna/0,,OI1432820-EI8142,00.html). Fora o estupro sistemático de crianças aqui mesmo na África do Sul, mulheres apedrejadas até a morte em alguns países mulçumanos e tantas e tantas outras barbaridades ocorrendo ao redor do globo que eu não teria nem tempo, nem espaço e, vou ser sincero, nem coragem, de resumir aqui nesse espaço virtual. Eu geralmente não gosto nem de ler, nem de comentar, quiçá pensar nesses assuntos, mas minha consciência me impede de fechar os olhos para tudo isso.

E a causa de tudo isso? O ódio, que por sua vez deriva do egoísmo que faz parte da natureza humana. Mas por mais que faça parte de nossa natreza, eu ainda o considero inaceitável, ainda mais depois de tantos e tantos anos de história. Penso que todo esse desenvolvimento da humanidade deveria ter erradicado o ódio do coração dos homens ha muito.

Mas infelizmente não foi.

Não vejo nenhuma solução a curto prazo para isso. Se não aprendemos nada nesse sentido em 3 mil anos de civilização, como esperar que o ódio seja extinguido na curta duração da minha existência nesse planeta?

Mas acho que a luz no fim do túnel talvez esteja em uma sociedade mais igualitária, onde as diferenças sociais sejam reduzidas e os benefícios da civilização divididos entre todos. Desejo, necessidade, vontade, como na música dos Titãs, podem certamente desencadear o ódio. Odeio, porque desejo e não posso ter. Odeio, porque necessito e não tenho. Odeio, porque tenho vontade de ter, mas não posso...

Mas claro, esperar igualdade em um mundo capitalista é de uma utopia do tamanho do universo (ou maior).

Mas não pense você leitor que nós, as pessoas ditas "razoáveis", não contribuímos para o ódio humano.

"A mão que faz a bomba, faz o samba
E Deus, faz gente bamba"

Contribuímos, e as vezes nem nos damos conta disso. Como no trecho do samba acima, cada pessoa é capaz do ato mais belo e do mais terrível também. Como?

... como quando andamos pelas cidades e simplesmente ignoramos crianças e moradores de rua. Ignorar é também uma forma de ódio. Não tenham ilusões quanto a isso.

... como quando furamos a fila do cinema, do banco, de um espetáculo, etc. Desrespeitar o direito os outros também é uma forma de ódio. Não tenham ilusões quanto a isso.

... como quando perdemos a paciência (ou somos babacas mesmo) e desrespeitamos as regras de trânsito ou fazemos manobras arriscadas ao volante. Colocar em risco a vida de outrem também é uma forma de ódio. Não tenham ilusões quanto a isso.

... como quando para o ato de fumar, para aqueles que fumam. Intoxicar o próprio corpo e o ar daqueles que estão a sua volta também é uma forma de ódio. Não tenham ilusões quanto a isso.

... como quando pensamos ou falamos mal de alguém, muitas vezes sem conhecer a pessoa ou tendo apenas uma visão parcial sobre a mesma. Isso também é uma forma de ódio. Não tenham ilusões quanto a isso.

... como quando cultivamos todo e qualquer tipo de preconceito, seja ele social, comportamental, estético, racial ou religioso. Mesmo que não se exerça esses preconceitos na prática, só de tê-los em algum cantinho sombrio de nossa mente é uma forma de ódio. Praticá-los então é uma atrocidade. Preconceito também é uma forma de ódio. Não tenham ilusões quanto a isso.

E tantos outros exemplos cotidianos onde fazemos errado e não nos damos conta.

Não tenho ilusões e não sou hipócrita em acreditar que podemos ser corretos 100% das vezes. Mas podemos nos esforçar para o sermos pelo menos em 70% - devido as limitações da natureza humana.

Talvez assim deixemos o legado dos atos mais belos com um saldo positivo para as próximas gerações.

Pensem nisso.